20.10.08

Mon Rivette



Fui a Serralves ver La Religieuse, de Jacques Rivette. Não sabia que não era legendado e eu de francês pesco pouco mais que nada. Ver um filme sem entender a narrativa principal, faz-nos estar atentos a todas as outras narrativas. Dediquei-me, por exemplo, à das mãos de Anna Karina. Absorvida por todos os elementos visuais, da interpretação das personagens, à composição dos cenários, à movimentação das câmaras, fui observando como as mãos das freiras, regra geral, se escondiam nas mangas e como as de Suzanne (A. Karina) se evidenciavam muito mais. Fui registando como se fechavam, como se entrelaçavam numa reza, como a unha do polegar se cravava no dedo indicador enquanto o rosto atormentado se exprimia em dor e revolta. Fiquei especialmente contente com o facto de ter compreendido o diálogo entre Suzanne e a freira lésbica, acerca do efeito da presença dos homens sobre a primeira – mas o resto foi-me escapando com frequência. Espero um dia poder confrontar o produto da minha imaginação com a realidade do filme, mas até lá La Religieuse não pode ser senão my own private Rivette.

(Bónus: à saída da sala, dei de caras com Manoel de Oliveira e seu inseparável chapéu – escassos centímetros nos separavam. Apeteceu-me dar-lhe um abracinho, a si e aos seus iminentes 100 anos, mas resignei-me a uma vénia mental e a um sorriso para o ar. Que visão do caraças.)