28.2.11

Vertigens




Não tenho estômago para pés. Vocês sabem, pés. Aquelas pecinhas estaladiças e frágeis das quais dependemos para caminhar. No Kill Bill, quando a Uma entra na carrinha e se põe a olhar para os pés paralisados tentando que estes se mexam pelo poder das falinhas mansas e tudo o que vemos são duas patinhas completamente estáticas, o meu estômago entra em centrifugação. É quão sensível sou à natureza humana. Não faço peripécias com os meus dedinhos, ninguém estala aqui ossinhos ou sequer dobra o que houver para dobrar; ei, xô, ‘tá quietinho. Agora imaginem-me a ver o Black Swan. Pés e pezinhos e pezadas e dedinhos a mexericar e dedinhos a estalar e joanetes e curvaturas deformadas e unhas a sangrar. Para não falar das cenas igualmente impressionantes com as restantes partes do corpo da Natalie bailarina. Não estou completamente certa de que é coerente dizer que gostei muito de um filme que me deu uma quase contínua sensação de vómito, mas pelo menos sei que é possível gostar de um filme que não pretendemos de todo rever.

24.2.11

Intervalo

Bijagós: sociedade matriarcal?

23.2.11

Toto... Yes, Dorothy?


© Anna Kieblesz


Tinha eu catorze anos quando ele se apaixonou por mim. E eu está bem, até namoro contigo. Esteve 30 minutos (30 minutos!) com as mãos nos meus ombros a ganhar coragem para me beijar. Eu já só morria de vergonha e o gajo a tremer por todo o lado. Enfim, 30 minutos depois cansei-me, preguei-lhe um xoxo e fomos para casa. Estivemos no sofá, eu deitada no colo dele. Não me beijou uma única vez. Claro que perdeu a oportunidade para todo o sempre, porque aquilo acabou logo ali. Um dia disse-me que achava nojento eu não lavar o cabelo todos os dias. É deixá-lo a pensar que eu sou porca – eu cá penso coisas piores dele.

22.2.11

Funny or not / Here I come


© Diane Arbus


O meu extraordinário sentido de humor termina nas piadas sobre os subsídios à cultura.

21.2.11

#4




E é assim que dois paus-mandados (um mais do que o outro) me dão a oportunidade de criar o template para o blog com o melhor título de sempre.

Ó que azar, Balthazar


Au hasard Balthazar (1966), Robert Bresson


– E o burro sou eu? - perguntou Scolari.
– O burro sou eu. - respondeu Bresson.

20.2.11

[ O ]


© Menina Limão


Pics for the peeps?

Está bem, criei um flickr.

Minha linda,






PJ Harvey - The Glorious Land


Grata pela perfeição.

vá lá

19.2.11

We are so happy *glup*




Atravessa-me um grande choro festivo. A partir deste segundo não te ouço; tenho o corpo paralisado a conter um espasmo, os olhos fechados e os dedos tensos, a goela a querer abrir-se em berros catárticos.
O que bradarão estas vozes torturadas… spill the blood? É bem provável, Lucifer, mesmo sabendo que à ferida se segue a celebração. We are so happy, aqui cabem todas as contradições. Surpreendente não seria se o texto espelhasse o que a atmosfera encerra. Uma espécie de alegria nervosa, o sangue latejando desenfreadamente, uma catástrofe iminente.

Intervenientes: quatro adolescentes subitamente alapadas ao meu banquinho público

– Vamos jantar e depois vamos ao cinema?
– Vamos ao cinema à tarde?...
– Se vamos ao cinema depois de jantar, vamos ao cinema à noite… Não sei, segundo os meus cálculos… Mas se for segundos os cálculos de Einstein, se calhar vamos à tarde.
– Se for segundo Einstein, se calhar chegamos lá a tempo. (risos)

Lisbon in a draft, Lisbon in a post

As pessoas têm morrido sem a minha autorização e as outras que cá ficam têm o desplante de não me avisar; e a Angélica Liddell, que, como eu, «teve uma infância feliz e um desastre de adolescência», não se compadeceu da minha self pity, recusando-se a antecipar a passagem por Lisboa a tempo de me apanhar em órbita; e, depois, triste da vida em terra de mamãe, descubro que o Mark Ravenhill, que leio sofregamente, está em passeio artístico pela cidade quando eu não tenho condições para recebê-lo, ficando eu, mais uma vez, a chuchar no dedo; escrever este apontamento ao som de Silence 4 não é fácil – vejam lá isso; mas entretanto encontrei a Jucifer nas paredes do CCB com a minha história preferida («e depois morreram todos») e a vida portuense viu-se bem representada pelo Marco Mendes (porque é que nunca fomos à Cunha?); e conheci o Balthazar, o Zé, a Ana, o Rui e já chega, e deixei saudades ao padeiro de Alcântara; e o Noobai só vende limonada suíça no Verão e o outro sítio das limonadas fechou sem que eu pudesse vir a (a)testá-lo; e é tempo de rever a Maria Schneider e o Marlon Brando e de vos contar a minha epifania com os White Stripes e de vos alertar para as injustiças de se morrer de pneumonia aos 42 anos quando se fez carreira a melhorar a vida dos demais. O dia chegará em que passarei da pista para a mesa de mistura do Roterdão e em que a sorte abençoará meu coração. Until then


Trish Keenan (Broadcast) - 1968-2011





Broadcast - Until Then

- -

Eu tenho raiva à ternura. Eu tenho raiva de ter raiva à ternura. Eu tenho a doença da ternura por ter raiva. Eu tenho tudo excepto a ternura. Eu não tenho ternura e sofro de inveja de quem tem ternura. Eu já só tenho raiva.

Manuel Cintra


18.2.11

Deal with it

Se estiverem com soluços, o susto não terá sido em vão: fui cortar o cabelo ao Hairtz e parte do meu pescoço saiu dali sozinho.



Bom, não é nada disso. Raparam-me o pescoço.

17.2.11

Alguns casais também


16.2.11

'tou tiste

Se eu lyoncificar o meu nome, sou insultada: Meniina once Lindhuxa. Fuck off, iá?

14.2.11

Feliz dia dos namorados ou da disfunção sexual ou lá o que é

11.2.11

Argumento: Menina Limão

Numa escandalosa imitação do
nasce
...

9.2.11

Eu recebo as melhores cartas

OS DEOLINDA???

Oh limoa, eu que gostava bastante do teu blogue...
Tive hoje a pior desilusão de todas...
Desculpa mas não volto a entrar no teu blogue, no entanto, quero agradecer-te por todos
os bons momentos que me fizeste passar! Obrigado por isso!
RIP

8.2.11

Misconceptions

Um imaginava-me uma bloquista freak com rastas. O outro julgava-me uma lésbica camionista. Ela pensou que eu era apenas antipática.
Logo eu que sou apenas uma gorda cheia de acne.

7.2.11

Peço desculpa por obrigar-vos a usar o scroll por causa de parvoíce

«A geração parva

Há mais ou menos dezoito anos, um editorial deste jornal teve a ideia de chamar “geração rasca” aos jovens que na altura tinham mais ou menos dezoito anos. A geração — essa geração, a minha — nunca mais conseguiu esquecer. Com toda a ambiguidade, levámos o nome a peito: ficámos ofendidos com ele, um pouco envergonhados sim, muito irritados também, mas fizémo-lo nosso sobretudo, tentando dar-lhe a volta (a “geração à rasca”) às vezes. Recusámo-nos sempre, sabe-se lá porquê — porque era injusto, digo eu —, a largá-lo.

Que o nome era injusto foi-se vendo depois. Na verdade, esta geração, que tem agora o dobro da idade, não foi absolutamente nada rasca. Pelo contrário, espanta-nos a nós — e a quem quiser observar — o quão cordatos fomos. Passámos a segunda metade das nossas vidas com esse ferrão do vexame em manifesto silêncio. Ouvimos até à náusea que éramos a “terra queimada” do sistema de ensino — chegámos a repeti-lo nós, por reflexo condicionado — até muito recentemente apenas se ter começado a reconhcer que afinal somos a “geração mais bem preparada” de sempre no país. O que pode não ser difícil, mas não deixa de ser verdade. E nestes anos todos, de forma passiva, cabisbaixa e rotineira lá fomos aceitando mais um estágio, mais um subemprego, mais uma caderneta de recibos verdes, mais um mês no call center, ou — pior ainda — um telefonema do call center a dizer que afinal não precisamos de ir neste mês nem nos seguintes.

***

Até que no outro dia, no Coliseu do Porto, a banda do momento, que leva um nome de mocinha de outros tempos — Deolinda — tocou em estreia absoluta uma música cujos versos começam, de mansinho, “sou da geração / sem remuneração”. Às palavras, claras e bem articuladas, o público que nunca as tinha ouvido reagiu primeiro com uma ligeira gargalhada. A música é também ela falsamente branda e delicada; em três minutos somente veremos que fomos enganados pelas aparências e que ela tem dentro uma raiva cristalina.

As rimas prosaicas, que parecem piadas e na verdade são facas — “isto está mau e vai continuar / já é uma sorte poder estagiar” — vão entrando na carne do público a pouco e pouco. Aqueles que lá estavam e tinham aquela idade — “a geração do vou-queixar-me-pra-quê / há bem pior do que eu na TV” — reconheceram-se ao espelho.

Irónica, muito muito cansada e lamentosa, a vocalista vai repetindo sobre o repenicado das guitarras, “que parva que eu sou”, “que parva que eu sou”. Insultando-se para não insultar o mundo porque afinal — a coisa menos rasca do mundo — somos bem educadinhos. Só quando a rede já está lançada a canção se diz, não vá alguém levar a mal, numa sugestão apenas:

“…fico a pensar, que mundo tão parvo / onde para ser escravo / é preciso estudar.”

Neste momento, o público estava pasmado. Na última estrofe — “sou da geração do já-não-posso-mais / que esta situação dura há tempo demais” — estava conquistado. No fim da canção aplaudiu de pé. Uns estavam arrepiados, outros comovidos. A cantora levantou os dois braços, numa espécie de alívio, como quem finalmente disse uma coisa que estava entalada. Vão ver: alguém filmou, pôs na internet, partilhou; nasceu um fenómeno. A geração finalmente pôs um nome a si mesma.

Pois é, Deolinda: que parvos que somos. Que parvos que fomos. Que parvos que temos sido. Mas ninguém pode ser parvo tanto tempo assim. Vê lá: se mudássemos aqui uma letra, e substituíssemos ali por outra — voilà! — ainda iríamos a tempo de ser a geração brava, não era?»

Rui Tavares